sábado, 14 de agosto de 2010

MEDO DO ESCURO

Era uma vez uma minhoca. Ela gostava de claridade, mas não do escuro. Ela tinha medo do escuro. As coisas pareciam outras coisas. O cabideiro parecia um pirata. As meias pareciam pássaros e os quadros pareciam sapos.




Ela entrou no escuro com medo. Caíram meias em cima da minhoca. Choveu bolas e a minhoca gritou: AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA. A minhoca voou.


Ela caiu no chão e ficou presa na terra.







Os olhos da minhoca doeram. A minhoca disse: Ai meus olhos!






Ela foi se arrastando até a praia e pôs os olhos na maré... Os olhos melhoraram, mas o medo não.



A minhoca saiu da terra e disse: UFA!


Mas uma bola de tênis caiu no buraco. A minhoca disse: AAAAAAAAAAAAAAAAA.


Então a joaninha falou para a minhoca: Porque você não compra um abajur? A minhoca falou: Boa idéia! Tenho 1.000.000 de dólares!








A minhoca comprou o abajur e fim!




MATHEO ANGELO (2009)




Também tenho medo do escuro e das formas que se transformam na ausência da luz. Todas as noites desconfio que os livros mudam de lugar na estante ou que os quadros mudam de lugar na parede. Mas Matheo nunca soube disso! Eu apenas seguro a sua mão e digo: Se você olhar bem, nada mudou! Mas, secretamente, em cumplicidade, eu sei que a razão não pode dissipar o medo... Ele, o medo, nos arremessa coisas, nos aprisiona à terra, nos arrasta. No escuro estamos sempre procurando alívio para os nossos olhos, para aquilo que não podemos ver, algum mar que nos salve dos fantasmas ao nosso redor. Num relance de claridade, porém, lembramos da fortuna que temos guardada naquilo que somos e a luz acolhedora do abajur surge. Essa meia-luz não desfaz medos, nem faz as coisas voltarem a ser o que realmente são no meio da noite. Mas, amorosamente, protege o sono dos meninos e das meninas. 


Rosmari Pereira de Oliveira










domingo, 1 de agosto de 2010

A MUCHACHA E SEUS GUARDAS



                                                                                     computador, 2008

 

Era uma vez uma dama francesa bem bonita chamada Muchacha Bela. Ela tinha guardas que protegiam a Muchacha do perigo. Eram muito corajosos... Umas 1.7320508 vezes muito corajosos!

Mas um dia a Muchacha foi capturada pelo malvado (9-6) – o Nine-Six. Ele é o homem mais malvado de todos os homens do mundo e o (9-6) fez 109 desafios.

O 1º deles era o desafio da raiz-quadrada. Quem definir mais raízes quadradas passa para o 2º desafio. Então o (9-6) disse: Rapazes, qual é a raiz-quadrada de 1.7320508? Um dos guardas disse: 3, a resposta é 3. (9-6) disse: Entrem no site www.cauculadora.org porque não responderam a resposta correta! Um dos guardas disse: Vou pesquisar no site www.pesquisas.com.br para ver a verdade. Então o guarda entrou no site e viu que a raiz-quadrada de 1.7320508 era 3 e ai o guarda ganhou R$1,256 e comprou um mp3 no site www.compras.com.

Aí o 2º desafio foi à corrida envenenada. Era assim: Havia umas 11000011 cobras atrás da porta vermelha e as 11000011 cobras iriam abrir a porta vermelha. Ganharia quem passasse pela fita sem ser atingido por uma das 11000011 cobras. Então a corrida começou e o juiz disse: Os guardas estão na frente, estão 2586 vezes na frente e não foram mordiscados e cruzaram a linha de chegada, eles ganharam o 2º desafio.

O 3º desafio foi de matemática. Ganhava quem respondesse o resultado certo e o (9-6) disse: Rapazes, quanto é 18+18 hein? Um guarda disse: 36, a resposta é 36! O (9-6) disse: Deixe-me ver, 18+18=36. Não acredito 18+18=36! De novo não! Os guardas ganharam o desafio de novo. Eles tiveram sorte 3 vezes! Nesse boletim os guardas eram muito espertos!

Aí o 4º desafio foi o desafio da maior fome. Ganhava quem comesse mais tortas de queijo sem ficar gordo demais. Então o juiz disse: Puxa os guardas comeram 11000 tortas e o (9-6) comeu só 50 tortas. Os guardas ganharam! O guarda comprou um PSP no site www.comprarjogos.com.br.

Aí o 5º desafio foi o desafio de quem fazia mais bolinhos sem pedir arrego. Terminar daqui há 3 dias e 4 noites ou 5h nem pensar! Só valia 30 minutos de tempo. Então o jogo começou e o juiz disse: Os guardas estão fazendo cada bolinho em um minuto e o (9-6) cada um em 8 minutos. Aí os guardas ganharam o jogo e ai foi intervalo.

Então os guardas tentaram salvar a Muchacha, Eles disseram: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50! Arrancar agora! E então a Muchacha foi salva e o (9-6) foi preso por 97 anos e fim.



MATHEO ANGELO (2010)


Eu olho para esse texto e vejo um menino falando de seu tempo. Reflito: Se a escola (como instituição educacional) tivesse ouvidos para ouvir e olhos para ver, encontraria nas histórias desses meninos desse tempo uma legítima fórmula de avaliação! Aqui Matheo faz quase um elogio ao currículo de sua atual escola, passando pelo português, espanhol, inglês, história, informática, matemática, ética, ciências...Vejo ainda como a vida pode ser generosamente traduzida em matemática e como números podem se transformar em intenção, poder, elogio, adjetivo, substantivo (o Nine-Six!). Preocupo-me com a dose adequada desse mundo virtual para o meu filho, mas não me canso de perceber o quanto essa linguagem, se bem conduzida, pode ter o ritmo e o colorido de sua imaginação. Confesso que fiquei preocupada com a Muchacha que ficou presa e sumiu durante toda a história, enquanto seus guardas se deliciavam em vencer os desafios do vilão! Mas que nada! Lá estava ela de volta sã e salva no final da história, assim como Matheo!